De
assinaturas gratuitas a doações para colações de grau, eles inventam de tudo na
hora de aplicar
O GOLPE DA REVISTA
Quando saímos às ruas estamos vulneráveis a todos os tipos de situações, de
acidentes a assaltos e até mesmo a passarmos incólumes por tudo isso. Mas e
quando somos vítimas de golpes que nem mesmo imaginamos estarem acontecendo?
Quantas vezes não somos abordados por estranhos pedindo doações, oferecendo
serviços ou produtos em troca de um dinheiro trocado?
Diante disso saímos às ruas de São Paulo para tentar descobrir como
funciona o golpe das assinaturas e doações de revistas. Como funciona, quem são
os envolvidos e como as vítimas são atraídas você conhecerá a seguir.
Av. Paulista, saída do metrô brigadeiro, sábado 10 horas
da manhã.
Milhares de pessoas saem da estação em direção a seus cursos semanais,
trabalhos ou mesmo para passear numa das avenidas que está se tornando um dos
maiores shoppings abertos de São Paulo. Logo quando saem na calçada são
abordadas por pelo menos um dos três rapazes que esticam, sem ao menos esperar
a resposta, revistas na sua frente. São os mais variados títulos e rapidamente
ele anuncia que a revista é gratuita, bastando que para isso o transeunte lhe
dê uma doação para sua festa de formatura. De pelo menos dez pessoas que
observamos terem sido abordadas, sete foi o número que recusou e passou direto,
somente três fizeram algum tipo de doação, sem ao menos perguntarem de que
faculdade se tratava, ou de que curso estavam se formando.
Ao abordar um dos formandos, soubemos que se tratava de Leandro, estava no
último ano de jornalismo da UNIP Vergueiro e junto com seus colegas tinha
recebido uma doação de revistas da editora Globo para arrecadar dinheiro para
sua formatura. Quando esticamos um pouco mais o papo, o discurso mudou, as
revistas na sua grande maioria eram compradas por eles mesmos no centro de São
Paulo e as doações eram restritas ao grupo pois ele tinha contatos nas
editoras, por já ter vendido assinaturas pelas empresas.
Leandro e seus dois amigos, que continuavam a oferecer as revistas às
pessoas que saíam ou entravam na estação, costumam tirar por dia de trabalho
nas ruas a quantia de 120 reais. Quando perguntado se o dinheiro iria todo para
a formatura ele mesmo confirmou que um pouco era usado para cobrir alguns
gastos pessoais, e que dava até pra sobrar alguma coisa pra cerveja.
Assim como Leandro existem em São Paulo várias pessoas que usam desses
argumentos para vender revistas velhas com um intuito filantrópico, estivemos
em distribuidoras e sebos de revistas no centro de São Paulo, região da Santa
Efigênia para entender melhor como esse mercado funciona.
Em alguns fomos recebidos com desconfiança, ao sermos apresentados como
estudantes que gostariam de comprar revistas para revender nas portas das
faculdades e arrecadar dinheiro para nossa colação nos ofereceram um desconto
de 50% no preço de capa (já baixo por se tratarem de revistas antigas), para
compras acima de 120 reais. Sem mais detalhes sobre outras pessoas que costumam
comprar as revistas para esse fim, fomos até outro estabelecimento.
Na distribuidora Farah conhecemos Jorge Farah, filho do fundador da
distribuidora nos anos 50, Jorge foi bem solícito, nos contou que um de seus
clientes, que não quis identificar, trabalhou durante 8 anos vendendo as
revistas como formando de faculdade. Comprava da distribuidora diariamente 20
reais em exemplares todos os dias e conseguia um lucro aproximado de 2 mil
reais mensais. Só parou porque havia conseguido um emprego recentemente em escritório
que pagaria o mesmo. Jorge contou que muitas pessoas compram as revistas usadas
com esse intuito e muitos compram desses golpistas, sabendo tratar-se de uma
mentira.
Quando o golpe da revista acontece, somente através da mentira sobre o
destino da doação, o prejuízo não chega a ser tão grande. Afinal, o cliente
leva na hora uma revista que chegou a custar em banca 12 reais, pelo valor
simbólico de 2 ou 5 reais, depende de quão generoso é o abordado. Mas quando o
golpe atinge níveis de estelionato é que o negócio complica.
Mariana Carvalho foi vítima do golpe da assinatura, ela foi abordada na
porta da faculdade FAAP, e diz que mesmo depois de perceber o golpe na fatura
do cartão, viu os vendedores da editora na porta da faculdade, ela se
responsabiliza por não ter dado mais atenção a abordagem, poderia ter percebido
que a oferta era boa demais e pretende ficar mais atenta com essas facilidades.
Eles lhe ofereceram algumas assinaturas por preços irrisórios, o equivalente a
postagem dos exemplares, mas na fatura do cartão veio a surpresa, parcelas que
totalizavam cerca de 700 reais, e referiam-se ao valor cheio das assinaturas,
sem descontos.
O número de reclamações no Procon de São Paulo sobre esse tipo de golpe
chega hoje a pelo menos 20 ao ano, esse número já foi maior, mas em 2006,
editoras, administradoras de cartões e Procon fizeram um workshop para
encontrarem a solução afim de diminuir ou quem sabe até mesmo acabar com golpes
na venda de assinaturas, que na época era ainda mais alarmante, desse encontro
saiu uma decisão que ajudou muito a reduzir a ocorrência desse tipo de
problema. Hoje existe um acordo que prevê uma multa para o representante de
vendas, no valor de R$ 90 por assinatura contestada pelo cliente. Esta multa
será aplicada a quem atingir um determinado percentual de assinaturas que foram
rejeitadas (2% com os cartões Visa e 4% para os cartões Redecard), calculado
sobre o total de vendas feitas no mês. No caso de reincidência, o representante
é descredenciado pela editora. Segundo Fernando Costa, presidente da Comissão
de Assinaturas da Aner (Associação Nacional de Editores de Revistas), “além
dessas medidas punitórias, estamos monitorando todo o setor juntamente com as
administradoras de cartão para evitar essa prática”.
Seja através da venda indevida de assinatura ou mentira sobre o destino do
dinheiro arrecadado o golpe da revista ainda está aí fora e todo cuidado é
pouco quando um estranho o aborda pedindo sua atenção ou cartão de crédito. No
caso dos formandos, foi verificado que no campus informado por Leandro que ele
não é estudante, e esse tipo de ação não é usado pela comissão para arrecadar
dinheiro para a formatura. Já Mariana conseguiu provar que foi vítima do golpe
justamente por sua família ser assinante da editora há anos e as revistas não
condizerem com o perfil consumido por eles, além de na época Mariana ser menor
de idade e incapaz de avaliar as ofertas a que foi submetida.
Atenção
e prudência nesses casos são essenciais para que não sejamos vítimas
irremediáveis de golpes de estelionato ou para que não caíamos na lábia de
malandros afim de ganhar um trocado à custas da bondade alheia para patrocinar
seus mais diversos vícios.
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