segunda-feira, 18 de junho de 2012

O Golpe da Revista

Trabalho Jornalismo Investigativo - Golpe da Revista




De assinaturas gratuitas a doações para colações de grau, eles inventam de tudo na hora de aplicar

O GOLPE DA REVISTA


Quando saímos às ruas estamos vulneráveis a todos os tipos de situações, de acidentes a assaltos e até mesmo a passarmos incólumes por tudo isso. Mas e quando somos vítimas de golpes que nem mesmo imaginamos estarem acontecendo?

Quantas vezes não somos abordados por estranhos pedindo doações, oferecendo serviços ou produtos em troca de um dinheiro trocado?

Diante disso saímos às ruas de São Paulo para tentar descobrir como funciona o golpe das assinaturas e doações de revistas. Como funciona, quem são os envolvidos e como as vítimas são atraídas você conhecerá a seguir.


Av. Paulista, saída do metrô brigadeiro, sábado 10 horas da manhã.

Milhares de pessoas saem da estação em direção a seus cursos semanais, trabalhos ou mesmo para passear numa das avenidas que está se tornando um dos maiores shoppings abertos de São Paulo. Logo quando saem na calçada são abordadas por pelo menos um dos três rapazes que esticam, sem ao menos esperar a resposta, revistas na sua frente. São os mais variados títulos e rapidamente ele anuncia que a revista é gratuita, bastando que para isso o transeunte lhe dê uma doação para sua festa de formatura. De pelo menos dez pessoas que observamos terem sido abordadas, sete foi o número que recusou e passou direto, somente três fizeram algum tipo de doação, sem ao menos perguntarem de que faculdade se tratava, ou de que curso estavam se formando.

Ao abordar um dos formandos, soubemos que se tratava de Leandro, estava no último ano de jornalismo da UNIP Vergueiro e junto com seus colegas tinha recebido uma doação de revistas da editora Globo para arrecadar dinheiro para sua formatura. Quando esticamos um pouco mais o papo, o discurso mudou, as revistas na sua grande maioria eram compradas por eles mesmos no centro de São Paulo e as doações eram restritas ao grupo pois ele tinha contatos nas editoras, por já ter vendido assinaturas pelas empresas.

Leandro e seus dois amigos, que continuavam a oferecer as revistas às pessoas que saíam ou entravam na estação, costumam tirar por dia de trabalho nas ruas a quantia de 120 reais. Quando perguntado se o dinheiro iria todo para a formatura ele mesmo confirmou que um pouco era usado para cobrir alguns gastos pessoais, e que dava até pra sobrar alguma coisa pra cerveja.

Assim como Leandro existem em São Paulo várias pessoas que usam desses argumentos para vender revistas velhas com um intuito filantrópico, estivemos em distribuidoras e sebos de revistas no centro de São Paulo, região da Santa Efigênia para entender melhor como esse mercado funciona.

Em alguns fomos recebidos com desconfiança, ao sermos apresentados como estudantes que gostariam de comprar revistas para revender nas portas das faculdades e arrecadar dinheiro para nossa colação nos ofereceram um desconto de 50% no preço de capa (já baixo por se tratarem de revistas antigas), para compras acima de 120 reais. Sem mais detalhes sobre outras pessoas que costumam comprar as revistas para esse fim, fomos até outro estabelecimento.

Na distribuidora Farah conhecemos Jorge Farah, filho do fundador da distribuidora nos anos 50, Jorge foi bem solícito, nos contou que um de seus clientes, que não quis identificar, trabalhou durante 8 anos vendendo as revistas como formando de faculdade. Comprava da distribuidora diariamente 20 reais em exemplares todos os dias e conseguia um lucro aproximado de 2 mil reais mensais. Só parou porque havia conseguido um emprego recentemente em escritório que pagaria o mesmo. Jorge contou que muitas pessoas compram as revistas usadas com esse intuito e muitos compram desses golpistas, sabendo tratar-se de uma mentira.

Quando o golpe da revista acontece, somente através da mentira sobre o destino da doação, o prejuízo não chega a ser tão grande. Afinal, o cliente leva na hora uma revista que chegou a custar em banca 12 reais, pelo valor simbólico de 2 ou 5 reais, depende de quão generoso é o abordado. Mas quando o golpe atinge níveis de estelionato é que o negócio complica.
Mariana Carvalho foi vítima do golpe da assinatura, ela foi abordada na porta da faculdade FAAP, e diz que mesmo depois de perceber o golpe na fatura do cartão, viu os vendedores da editora na porta da faculdade, ela se responsabiliza por não ter dado mais atenção a abordagem, poderia ter percebido que a oferta era boa demais e pretende ficar mais atenta com essas facilidades. Eles lhe ofereceram algumas assinaturas por preços irrisórios, o equivalente a postagem dos exemplares, mas na fatura do cartão veio a surpresa, parcelas que totalizavam cerca de 700 reais, e referiam-se ao valor cheio das assinaturas, sem descontos.

O número de reclamações no Procon de São Paulo sobre esse tipo de golpe chega hoje a pelo menos 20 ao ano, esse número já foi maior, mas em 2006, editoras, administradoras de cartões e Procon fizeram um workshop para encontrarem a solução afim de diminuir ou quem sabe até mesmo acabar com golpes na venda de assinaturas, que na época era ainda mais alarmante, desse encontro saiu uma decisão que ajudou muito a reduzir a ocorrência desse tipo de problema. Hoje existe um acordo que prevê uma multa para o representante de vendas, no valor de R$ 90 por assinatura contestada pelo cliente. Esta multa será aplicada a quem atingir um determinado percentual de assinaturas que foram rejeitadas (2% com os cartões Visa e 4% para os cartões Redecard), calculado sobre o total de vendas feitas no mês. No caso de reincidência, o representante é descredenciado pela editora. Segundo Fernando Costa, presidente da Comissão de Assinaturas da Aner (Associação Nacional de Editores de Revistas), “além dessas medidas punitórias, estamos monitorando todo o setor juntamente com as administradoras de cartão para evitar essa prática”.

Seja através da venda indevida de assinatura ou mentira sobre o destino do dinheiro arrecadado o golpe da revista ainda está aí fora e todo cuidado é pouco quando um estranho o aborda pedindo sua atenção ou cartão de crédito. No caso dos formandos, foi verificado que no campus informado por Leandro que ele não é estudante, e esse tipo de ação não é usado pela comissão para arrecadar dinheiro para a formatura. Já Mariana conseguiu provar que foi vítima do golpe justamente por sua família ser assinante da editora há anos e as revistas não condizerem com o perfil consumido por eles, além de na época Mariana ser menor de idade e incapaz de avaliar as ofertas a que foi submetida.

Atenção e prudência nesses casos são essenciais para que não sejamos vítimas irremediáveis de golpes de estelionato ou para que não caíamos na lábia de malandros afim de ganhar um trocado à custas da bondade alheia para patrocinar seus mais diversos vícios.

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